Thursday, January 14, 2010

180) China: Uma geração quase livre de Mao

Uma geração quase livre de Mao
John Lee
Valor Econômico, 14/01/2010, pág. A15

A próxima geração de líderes será mais confiante e assertiva e julga cautela como paralisia.

A nomeação de cinco chefes de nível provincial do Partido Comunista chinês no início de dezembro passado é um lembrete de que a ascensão da nova geração de líderes na China, que assumirá o poder em 2012, pode ser o acontecimento mais importante na política chinesa desde o início do reinado de Deng Xiaoping, em 1978. A nova geração de líderes será a primeira com escassa ou nenhuma memória pessoal da turbulência e dificuldades durante os anos de Mao Tse-tung. Esquecer essa história poderá condenar a China a repetir os erros do passado; mas, para bem ou para mal, isso também poderá reduzir restrições e liberar seus dirigentes.

Todos os cinco nomeados nasceram após a fundação da República Popular em 1949. Dois deles, Hu Chunhua e Sun Zhengcai, têm apenas 46 anos. Isso é coerente com a política recentemente anunciada pelo partido, de que a próxima geração de líderes deve ter idade média em torno de 55 anos, e que até quatro altas posições sejam preenchidas por líderes que ainda não tenham completado 50 anos. O objetivo do partido é garantir que permaneça vigoroso e dinâmico, acompanhando a ascensão da China.

Isso parece uma decisão sábia. Na última década e meia, a atuação da liderança chinesa foi em termos de ajuste fino e de manutenção da dinâmica do modelo de desenvolvimento liderado pelo Estado, estabelecido por Deng e deflagrado após os protestos na Praça da Paz Celestial, em 1989. Nesse aspecto, a terceira e quarta gerações de líderes chineses, sob os tecnocratas Jiang Zemin e Hu Jintao, foi competente, mas desprovida de imaginação.

Mas a viabilidade do modelo de Deng está chegando a seu fim, e a China está agora viciada em ineficiente crescimento movido a investimento estatal em infraestrutura e insustentável crescimento puxado por exportações - em vez de crescimento interno, para gerar emprego e crescimento. Progressos em novas reformas estruturais - como liberalização da moeda e da conta de capital e corte da dependência de empresas estatais em relação a capital estatal têm sido lentos, e as novas iniciativas têm sido fragmentadas e não abrangentes.

Sobre a política externa, Hu e Jiang têm seguido fielmente a máxima de Deng: "Ocultar capacidade e estimular obscuridade". Embora cada vez mais assertiva na África e na América Latina, a China continua a ser um "ator autônomo" sob o guarda chuva de segurança americano.

As gerações mais velhas veem essa cautela como prudência, e esse conservadorismo se reflete nos atuais líderes chineses. A ausência de reforma em termos amplos atesta o temor coletivo das gerações mais velhas de que mudanças estruturais fundamentais produzirão tumulto e caos, ameaçando a manutenção do Partido no poder. Eles ainda se lembram do sofrimento dos anos de Mao, quando a China caminhou na direção errada - e tentou fazê-lo depressa demais - e recordam vividamente como os protestos na Praça da Paz Celestial pôs o regime de joelhos, e a irrupção de conflitos trabalhistas urbanos quando empresas estatais centralmente geridas foram fundidas ou fechadas na década de 1990.

Da mesma forma, embora a China continue fundamentalmente insatisfeita com suas fronteiras terrestres meridionais e com suas fronteiras marítimas a leste e sudeste, seus atuais dirigentes temem que o resultado de uma política externa assertiva e agressiva seria isolamento. Todas as elites - jovens e idosas - veem a China como líder natural na Ásia e consideram os EUA como um intruso recente. Mas, para a terceira e quarta gerações de líderes, dar aos EUA e a seus aliados e parceiros uma desculpa para "conter" a China - e restringir seu desenvolvimento econômico - permanece sendo o grande pesadelo.

Sem experiência pessoal da traumática recente história chinesa, a próxima geração será mais confiante e assertiva. Formada em economia, política e direito, em vez de engenharia, a nova geração tentará acelerar o crescimento e a transformação da China, considerando cautela como paralisia. Mesmo agora, os líderes emergentes argumentam que a China está se movendo muito lentamente nos terrenos de reforma econômica e de objetivos de política externa. Para melhor ou para pior, eles não se deterão diante dos temores de consequências não intencionais quando se trata de mudança e experimentação.

Otimistas esperam que isso possa acelerar a liberalização econômica, e talvez até mesmo resultar em moderada reforma política, especialmente maior cobrança de responsabilidade das autoridades locais. Afinal, foram as autoridades chinesas mais jovens que levantaram sistematicamente nos congressos do partido a questão da corrupção em nível local.

Mas as consequências para a política externa poderão ser ainda maiores. Tendo crescido numa China hoje aceita legitimamente como uma grande potência, a nova geração de líderes estará mais impaciente para que os chineses retomem seu lugar na Ásia. Embora estadistas mais velhos orgulhem-se do quanto a China avançou, mais jovens figuras no Partido e elites - especialmente aqueles que retornaram de universidades americanas e ocidentais - estão frustrados com o fato de que a posição estratégica chinesa na Ásia, e seu status no âmbito das instituições mundiais e regionais, continuam a ser fracos, apesar do crescente poder econômico do país.

Por exemplo, grande parte do discurso segundo o qual a China deveria assumir a liderança nas instituições regionais, e de que os navios chineses deveriam ter maior presença em rotas marítimas vitais como o Estreito de Malaca, e até mesmo no Oceano Índico, vem da geração mais jovem. Os líderes mais jovens do Partido também estão impacientes quando se trata de um calendário para a devolução de Taiwan.

A China está em "ponto-morto". Mas isso vai acabar quando a próxima geração assumir o poder em 2012. Quando a hora deles chegar, o mundo estará lidando com uma potência muito mais imprevisível do que a que conhecemos agora.

John Lee é um pesquisador de política externa no Centro de Estudos Independentes, em Sydney, e pesquisador-visitante no Instituto Hudson, em Washington, DC. Lee é autor de Will China Fail? (A China fracassará?)
Copyright: Project Syndicate, 2009.

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