O significado real da primazia chinesa nas exportações
Daniel Ikenson
Ordem Livre, 12/01/10
O Washington Post noticia que a China ultrapassou a Alemanha para se tornar o maior exportador do mundo em 2009, somando mais um feito econômico à sua sala de troféus em expansão. Sem dúvida, os céticos quanto ao comércio americano e os globófobos considerarão essa "acolada" a última prova do declínio americano e da ascendência chinesa. Mas mais do que qualquer reflexão do poder econômico da China, esse marco testemunha a bem-sucedida erosão das barreiras tecnológicas, físicas, políticas e econômicas que antes restringiam as possibilidades humanas.
A ampla liberalização do comércio e das regras de investimento que começou para valer depois da Segunda Guerra; a abertura da China ao Ocidente, começando com as reformas em 1978; a queda do Muro de Berlim em 1989 e da União Soviética dois anos depois; o colapso do comunismo como uma escolha viável para países em desenvolvimento; o advento e a proliferação de containers marítimos, tecnologia de GPS, técnicas de gerenciamente de cadeias de abastecimento just-in-time, e outras maravilhas das revoluções na informação, nos transportes, e nas comunicações levaram a uma divisão global do trabalho e uma forma de fazer as coisas que desafiam as preocupações das políticas comerciais tradicionais, e tornam a contabilidade do fluxo de comércio completamente sem sentido.
Tomando emprestado o tema e algumas expressões de meu artigo recente "Made on Earth" ["Fabricado na Terra"], a economia global não é mais uma competição entre "nós" e "eles". Não são mais os "nossos" produtores contra os "outros" produtores. Em vez disso, por causa dos investimentos que cruzam fronteiras e cadeias de abastecimento e produção transnacionais, o chão de fábrica arrebentou as paredes e agora abrange oceanos e fronteiras, fazendo com que trabalhadores de vários países colaborem, e até se complementem, em muitos empreendimentos. Há competição, é claro, mas essa competição frequentemente é entre cadeias de produção/abastecimento ou marcas que desafiam qualquer identificação nacional significativa, porque os produtos finais são compostos de valor agregado de vários países. Assim, há cooperação dentro das cadeias de produção e abastecimento antes que haja competição entre elas.
Então, o que tudo isso tem a ver com o status da China como o maior exportador do mundo? Significa que devemos evitar a tentação de atribuir o significado errado ao título. A China se tornou o maior exportador do mundo principalmente porque a divisão global de trabalho que ajudou a reduzir o fardo da pobreza e criar maior riqueza ainda prescreve à China o papel de produção de baixo valor agregado e operações finais de montagem nas cadeias globais de produção e abastecimento.
Enquanto bens intermediários — componentes e matérias-primas — são enviados à China de países como o Japão, Taiwan, Cingapura, Austrália e Estados Unidos, essas entradas frequentemente são "encaixadas", ou talvez submetidas a alguma operação com um pouco mais de valor agregado antes de serem exportadas como bens finais. Para os propósitos da contabilidade do fluxo de comércio, o valor total da mercadoria é registrado como valor da exportação chinesa, mesmo quando apenas uma percentagem muito pequena é realmente trabalho, material e custo operacional chinês.
Essa metodologia contábil explica por que as exportações da China — para o mundo e para os Estados Unidos — aumentaram ao longo das décadas (conforme a divisão de trabalho evoluía e as cadeias de abastecimento proliferavam), e por que é um erro o foco político no décifit comercial bilateral dos Estados Unidos com a China. Como muito bem observado na conclusão deste estudo agora famoso sobre quem captura valor na cadeia de abastecimento do iPod:
"As estatísticas de comércio podem enganar tanto quanto informar. Para cada iPod de US$300 vendido nos EUA, o politicamente volátil décifit comercial dos Estados Unidos com a China aumenta em cerca de US$150 (o custo de fábrica). E no entanto, o valor agregado ao produto em sua montagem na China é provavelmente de alguns dólares no máximo."
O valor agregado na China é muito baixo e exportações de eletrônicos sofisticados de alta tecnologia. É mais alta em outros produtos que americanos importam da China. Segundo as descobertas de um artigo recente do National Bureau of Economic Research, "How Much of Chinese Exports is Really Made in China" ["Quanto das exportações chinesas é realmente fabricado na China"], cerca de 50% do valor de um container de carga típico importado para os Estados Unidos da China é valor agregado chinês, o que é compatível com outras estimativas.
Então, ao pensarmos sobre o significado do novo status da China como líder global das exportações, é importante entender o valor e as limitações dos dados sobre comércio. Os dados falam de forma muito mais convincente sobre as virtudes da interdependência econômica do que sobre a potência como exportadora da China isoladamente.
Publicado originalmente em Cato.org.
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